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23 de Abril de 2024

Justiça mantém afastamento do prefeito de Pacajus Flancky Chaves

Processo: 0627530-92.2017.8.06.0000 – Suspensão de Liminar ou Antecipação de TutelaAutor: Flanky José Amaral ChavesRéu: Ministério Público do Estado do Ceará

Publicado por Rogério Henrique
há 7 anos

DECISÃO MONOCRÁTICA

O caso originário: Trata-se de ação cautelar em caráter antecedente à ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público estadual perante à Comarca de Pacajus (processo no 0014857-96.2017.8.06.0136/0).

Na origem, o MP/CE alegou, em síntese, que o senhor José Wilson Alves Chaves (pai do prefeito afastado) – mesmo tendo os seus direitos políticos suspensos – interfere diretamente na Administração do Município de Pacajus, com concordância do Alcaide – Sr. Flanky José Amaral Chaves.

Sustenta ainda o Órgão Ministerial que os aludidos senhores, em associação com os demais envolvidos apontados na petição inicial, coordenam esquema permanente para cometer ilegalidades, sendo certo que, mesmo diante de recomendação do parquet, José Wilson Chaves continua interferindo no Poder Executivo municipal para o cometimento de ilícitos em processos de dispensa de licitação decorrentes do Decreto de Emergência no 001/2017.

O Ministério Público estadual afirma que os senhores em questão praticaram contratação de serviços sem qualquer coleta de preços, sem projeto de execução e mediante sobrepreço, pagamento de indenização sem comprovação real do dano, criação artificial de demanda por combustível nas secretarias que sequer possuíam veículos para a contratação de posto de gasolina específico, abastecimento de carros particulares com dinheiro do erário municipal, falsidade ideológica, dispensa indevida de licitação, defesa de interesses de empresas junto à comissão de licitação, assédio moral a servidores para o cometimento da prática de ilícitos e associação para cometer ilegalidades em série.

A decisão objeto do pedido de suspensão: o Juízo da 1a Vara da Comarca de Pacajus concedeu a liminar pleiteada, determinando, entre outras medidas, o afastamento imediato do Senhor Flanky José Amaral Chaves do cargo de Prefeito Municipal de Pacajus, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.

O pedido de suspensão: Alegando legitimidade ativa para o requerimento do incidente excepcional, o alcaide afastado do cargo sustenta, em resumo, que o simples afastamento ocasiona séria lesão à ordem pública.

Ademais, arguiu que a sua conduta não representaria nenhum perigo de dano à instrução processual, sendo certo que a decisão de primeiro grau estaria violando o parágrafo único, do art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei no 8.429/92). É o relatório. Passo a decidir.

FUNDAMENTAÇÃO

Registro inicialmente que a legitimidade ativa do Prefeito afastado para requerer o pedido de suspensão de liminar, embora excepcional, é assegurada pela doutrina especializada e pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.

Com efeito, ELTON VENTURI in Suspensão de Liminares e Sentenças Contrárias ao Poder Público, 3 ed, São Paulo: Malheiros, 2017, p. 116/117, assegura:

“(…) o mesmo caminho trilham os demais tribunais nacionais, que, a pretexto de ensejar maior tutela ao interesse público, têm reconhecido legitimação ativa para os pedidos de suspensão a agentes públicos afastados temporariamente do exercício de suas funções públicas. Isso vem ocorrendo, com bastante evidência, no âmbito de ações de improbidade administrativa.

Conforme vários precedentes do STJ, autoridades executivas e parlamentares afastadas de seus cargos em ação de improbidade administrativa estão habilitados a lançar mão do mecanismo suspensivo”.

Nesse sentido, julgado do Superior Tribunal de Justiça:

“(…) A jurisprudência da Corte Especial e a do c. Supremo Tribunal Federal têm admitido que prefeito afastado do cargo por decisão judicial pode formular pedido de suspensão de liminar e de sentença alegando grave lesão à ordem pública (v.g. STJ, AgRg na SLS 876/RN, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJe de 10/11/2008. STF, SS 444 AgR/MT, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ de 4/9/1992, e Pet 2.225 AgR/GO, Tribunal Pleno, Rel. p/ acórdão Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 12/4/2002)”. (AgRg na SLS 1.630/PA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/09/2012, DJe 02/10/2012).

Sendo assim, superada essa questão preliminar, convém estabelecer que o pedido de suspensão dirigido ao Presidente do Tribunal de Justiça visa a sustação da eficácia da decisão de primeira instância, sem implicar anulação ou reforma, razão por que não contém o efeito substitutivo, próprio dos recursos. É, para alguns, verdadeiro juízo político exarado pelos tribunais, a fim de estancar grave lesão à ordem, à saúde, à economia ou à segurança públicas, quando verificado um mínimo de plausibilidade à tese jurídica defendida pelo Poder Público (ou agente afastado), sem incursionar no mérito da ação principal.

Na lição de LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA, in A Fazenda Pública em Juízo, 13 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 606/609,:

“A causa de pedir é a violação a um dos interesses juridicamente protegidos previstos nas hipóteses de cabimento já examinadas (segurança, saúde, economia e ordem públicas). Esse é o mérito do pedido de suspensão de segurança, o que o distingue de um recurso. Rigorosamente, o pedido de suspensão destina-se a tutelar interesse difuso.

[…]

Sem embargo de o presidente do tribunal, no exame do pedido, não apreciar o mérito da demanda originária, é preciso, para que se conceda a suspensão, consoante firme entendimento do Supremo Tribunal Federal, que haja um mínimo de plausibilidade na tese da Fazenda Pública, exatamente porque o pedido de suspensão funciona como uma tutela provisória de contracautela” (grifo nosso).

No presente caso, no exercício desse juízo de plausibilidade mínimo, não encontro razões suficientes para determinar a concessão do efeito suspensivo pleiteado no pedido de contracautela excepcional.

De fato, dispõe o parágrafo único do art. 20, da Lei no 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa)

“Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual”.

Revela a norma, portanto, que, considerado o princípio da soberania popular, o afastamento do agente político do exercício do cargo é medida excepcional e voltada exclusivamente à incolumidade da instrução processual, que, na hipótese, ainda se fará necessária na ação civil pública a ser intentada.

O Ministro ALEXANDRE DE MORAES, doutrinando sobre o tema, in Direito Constitucional Administrativo, 3 ed, São Paulo: Editora Atlas, 2006, p. 345, relembra sábia e profícua lição do Ministro GILSON DIPP, do Superior Tribunal de Justiça, na Medida Cautelar no 1.730/SP, julgada em 12 de dezembro de 1999, verbis:

“em primeiro lugar, se existem indícios de que o administrador público, ficando em seu cargo, poderá perturbar, de algum modo, a coleta de provas do processo, o afastamento liminar se impõe, imediatamente, inexistindo poder discricionário da autoridade judiciária. Nem seria preciso tanto como se imagina para se determinar essa providência. Basta que, pela quantidade de fatos, pela complexidade da demanda, pela notória necessidade de dilação probatória, se faça imperioso o afastamento compulsório e liminar do agente público do exercício de seu cargo, sem prejuízo de seus vencimentos, enquanto persistir a importância da apuração de dados informativos ao processo. Daí, a necessidade da constrição ao exercício da atividade laboral, com o propósito de angariar a verdade dos fatos, com total isenção na produção das provas”.

In casu, entendo configurados os referidos indícios, uma vez que os autos demonstram claramente que o alcaide afastado, em conduta gravemente omissiva, vem permitindo a sistemática interferência de seu pai – o senhor José Wilson Alves Chaves – nos destinos da Administração municipal, sendo reveladores de tal conduta indevida os inúmeros depoimentos elencados na decisão de primeiro grau. De fato, a título de exemplo, asseveram as seguintes declarações:

“(…) fui convidado pelo pai, não sei porque o filho não estava (…) a ingerência ocorreu depois que assumi, ordens diretas pelo telefone ou pessoalmente, José Wilson determinou tarefas específicas, cobrou tarefas” (…) Ele sempre interferia”. (…) segunda-feira reunião na casa do José Wilson, que era normal, mais secretários, prefeito estava em reunião, o prefeito ficava calado”. (Marcel Levy, ex-secretário de desenvolvimento econômico).

“(…) minha saída se deu por causa do José Wilson Chaves, ele não deixou desenvolver meu trabalho (…) e para eu fazer as coisas erradas eu preferi pedir exoneração. (…) de certa forma quando eu estava fazendo um trabalho ele mandava eu parar, aí quebrava o ritmo. Falei com o prefeito e ele me disse fale com ele (José Wilson), eu disse o senhor é que tem que falar, na maioria das vezes José Wilson entrava solando (…)”. (Marcel Levy, ex-secretário de desenvolvimento econômico).

“(…) só recebia ordem de José Wilson, só dele, aliás eu não, todos secretários (…) e o prefeito acompanhava tudo, só que o prefeito não fala, não dá opinião, não abre a boca, você não sabe se ele estava achando ruim, mal, tudo é ele, continua sendo ele, é ele todo tempo (continua do mesmo jeito, não muda não, na hora que o filho vai resolver alguma coisa liga para ele (José Wilson)). (…) Dra. Nilzete, quem manda aqui sou eu, a senhora não foi eleita não, quem foi eleito foi meu filho, com meus votos, então quem manda aqui sou eu”. (Nilzete, ex- secretária de saúde).

“(…) pai do prefeito presente em reuniões, mas da forma como ele arbitrava as reuniões, o prefeito sempre calado, ele fazia determinações diretas aos secretários (…) o prefeito sempre de cabeça baixa, calado, na dele ouvindo sempre o pai dele se pronunciar” (José Ronilson, depoimento prestado ao MP).

A presença de José Wilson Chaves nos rumos cotidianos da Administração de Pacajus é prática constante e deletéria, sendo certo que os servidores – inclusive aqueles que ainda vão ser ouvidos na instrução processual da ação civil vindoura – declaram:

“(…) a ingerência do José Wilson é inconteste (…) inclusive eu vou lhe dizer como se dava o dia a dia dos funcionários em determinado momento e atuação do José Wilson era tão ostensiva em face dos servidores que entrava muita gente em minha sala se escondendo dele, enquanto ele andava por uma sala os outros vinham e se escondiam dele para não esbarrar com ele e ser demandado por ele ou ser assediado por ele, inclusive isso acontecia com pessoas que ele colocou por indicação política, pessoas que conheciam de longos anos, pessoas que relatavam que estavam sobrevivendo a custa de remédios para controle de ansiedade porque estavam sofrendo pressões diárias, constantes e acintosas (“…) (Rannieri, ex-secretário de administração e finanças).

Ademais, ao contrário do que pretende o requerente, “o afastamento do cargo, por si só, não implica lesão à ordem pública” (AgInt na SLS 2.127/TO, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/05/2016, DJe 15/06/2016).

A mencionada medida cautelar restou efetivamente fundamentada, conforme os termos do art. 93, IX da Constituição Federal. De fato, o magistrado de primeiro grau cuidou de bem estabelecer seus posicionamentos reveladores da necessidade do aludido afastamento, o que também adoto como razões de decidir, sendo prescindível a transcrição literal de

todos os argumentos da decisão monocrática.

Por fim, entendo que na hipótese o afastamento cautelar obedeceu o disposto no parágrafo único do art. 20 da Lei no 8.429/92, uma vez que não se baseou em simples ilações, indicando a juíza com precisão e baseada em provas, de que forma – direta e/ou indireta – a instrução processual foi tumultuada e ainda poderá ser, restando evidente que o comportamento do Prefeito afastado pode se alastrar para a ação civil pública.

DISPOSITIVO

Diante do exposto, INDEFIRO o pedido suspensivo. Fortaleza, 20 de setembro de 2017.

Expedientes necessários.

Desembargador FRANCISCO GLADYSON PONTES Presidente do TJCE

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